30.1.06

Coisa

Não há, realmente, nada como amar você
Esse tudo que parece sempre incompleto
Este longe que se sente mesmo perto
Plausível erro de quem vislumbra o certo

Por mais certeza que se tenha em não saber o que se faz

E lho sinto assim
Uma coisa que chega e parece que sempre se vai
Vazio que preenche
Concretude que com o brandir da saudade se esvai

Eterna percepção daquilo que não se define

São inúmeras as definições
Porém geralmente indefinidas
Pois que não postulam menor regra
De tão desregrado que se apresenta

Estranha esta intimidade com este total desconhecido

Escorrega pelos braços
Por vezes pesa, quase insuportável
Por outras escapa de tão volátil; maleável
Ainda assim, extremamente nosso, cismamos em dá-lo

Como se disponível fosse; um simples regalo

Abençoado como o mais maldito dos regenerados
Cultuado, venerado, adorado
Outrossim submisso, renegado, acossado
Indistintamente perseguido, objetivado

Estado de perfeição uníssono almejado

Um pulsar desesperado que te busca em cada canto
Motivado por paixões e desencantos
Regado ao suor do esforço
Ao desalento, ou alegrar dos prantos

Coisa que te quero e de ti espero em tanto

Descobri não ser tão auto-suficiente
Tampouco onipresente e uni subsistente
É coisa dada ao bom vício da concorrência
Da necessidade do corpo presente

Atitude de querer constantemente

Por isso não demore
Não faça com que por tristeza eu chore
Venha com sua peculiar e plural fome
Conserve-me e me devore

Esqueça os olhos e me olhe

Com o sentir da lembrança
Com o querer da esperança
Com a dúvida da segurança
Com a mão de quem alcança

Agitação incontinenti que amansa

Sai de ti e vem
Dê-se a si e me tem
Seja meu eterno alguém
Saiba-se não viver sem

Pense ser impossível e iremos além

Das estrelas que nos adornam
Da lua que remete ao que foi
Da infinitude do céu que escorre límpido
Do brilho do sol que ofusca quando vem

Sejamos mais do que o mundo que se oferece

E ao construir nossa morada
Sem trincheiras ou brigadas
Quero apenas o frescor das madrugadas
Nosso reflexo nas águas iluminadas

Nossa calma nas tardes descansadas

Tenhamos teto no sossego
Posse no desapego
Prisão na eterna e indisponível liberdade
Pois apenas aquele capaz de nos fazer livre

Naturalmente ama de verdade

16.1.06

Físico

Não há noção ainda do percorrido
E desinteressa este que não se pode mudar
Tem-se, de fato, a impressão sincera e real
Da proximidade com a chegada tão esperada

Engana-se por completo quem almeja o mero fim

Este será apenas meio
Ferramenta de um desejo maior
Um patamar seguro
De onde se pode avistar mais ao longe e respirar

É infinito o céu que se contempla

Ele chama como se urgente fosse
Conquistar seu azul e seu cinza peculiar
Agrada às vistas com o deslumbre do horizonte
Enche o peito de lágrimas quando torrencial chove

Inundando o querer de esperança

Mas há mudança neste combustível
O que antes era como uma entidade intocável, quase santo
Hoje é devasso e escravo das minhas atitudes
Uma prostituta virgem movida ao prazer das minhas conquistas

Agora acredito na concretude de meus sonhos

As tentativas estão mais consistentes
Os erros cada vez mais previsíveis, evitáveis: consumíveis
A distância, embora insabida é perceptível
Quase um objeto a se colocar no bolso

Falta realmente muito pouco

O esforço é proporcional
Assim como a velocidade dos tempos idos
Pois tempo é uma sensação e não uma coisa
Quando ocupamo-nos prazerosamente ele some

Insistir na contrariedade só traz angústia

E tudo se paralisa
O mundo pára
O peso pesa
E o pesar do mundo ampara

Todas as suas desculpas

O que se tem afinal
É um somatório de dúvidas e curvas
A cada volta enterramo-nos mais e mais
Inexiste a sensação de chão

Apenas um vôo livre e desgovernado

Anarquia nunca resultou em nada
Desde os primórdios
Existe um conceito
Que ajusta a vida em comum

Potencial é realmente nada sem controle

O mais importante deles
O exercido sobre nós mesmos
Deve ser administrado, treinado: dominado
Precisa, necessita e deve ser corriqueiro

Saber-se por inteiro é condição para dar-se e doar-se

Desprendimento não equivale a dação
Extrema agudeza de saber
Tem aquele que consegue desfazer de si
Para encontrar-se no outro

Religião do bem comum

Comungue a um lugar chamado nós
Peça a um deus chamado eu
Descubra um caminho chamado tempo
Seja uma vitória chamada resultado

Se esforce, vença e vá,

Pois sucesso é um mérito seu
Aceite quando conseguir êxito
Viva intenso este momento soberano
Só você sabe o quanto de sua paz está condensada ali

Expanda todas as suas virtudes

Só não reclame daquilo que não pode ter
Das coisas que não fez por onde conseguir
Tenhamos consciência que tentar é permitido
Mas que fazer tudo ao mesmo tempo é proibitivo

Escolhe, define, luta e consegue

2.1.06

Feliz dia novo

_Bom dia moço. Tudo em ordem?

_Bom dia. Tudo normal. Haveria motivo para desordem?

_Nenhum. A não ser pelo fato da certeza de que nem tudo que está em paz é pacífico.

_Como assim?

_Perceba como existe um burburinho crescente que vem com o silêncio. Sinta na aparente calmaria do oceano a profusão de ondas prestes a arrebentar sua força na areia. Se apenas fitarmos o superficial e palpável, pouco perceberemos do real valor das imagens que nos são ofertadas.

_Mas não tenho tempo para tanto esforço, o tempo não deixa de correr enquanto filosofo sobre o mundo.

_E quanto tempo tem além deste momento que agora consome? Quanto excesso ainda existe para desperdiçar com esta correria despropositada e sem motivo? O que lhe faz pensar que sua sobra é maior que aquilo que agora já lhe falta?

_Justo por não saber quanto disponho é que devo acelerar-me. Quem sabe quando não mais estarei aqui?

_Já se perguntou se está mesmo aqui? Se aqui é onde quer estar? E se positiva for sua resposta se lhe apraz o bastante o que és? E se de negativa forma responder, por que ainda não parou para se mover? Atinou para o quanto se ganha quando simplesmente não se perde?

_E por que esta sanha desesperada em conquistar e vencer se não preciso de mais batalhas. A vida já é muito dura para que eu tenha que enfrentar a todos. Na quietude de minha pouca ambição os dias passam e eu sobrevivo calmo, manso e imperceptível à mira alheia. Deveria expor-me pelo prazer de apenas vencer?

_Deveria vencer apenas por se expor. Ganhar de si próprio a cada pequena grande atitude. Deixar de imaginar que o mundo lhe admira como presa e descobrir pela definitiva vez que o domínio a ser exercido é aquele voltado para si. Acreditar na idéia simplória e grandiosa que poucos entendem. Espalhar pelo mundo a consciência que libertar é o caminho mais correto. Embora seja doloroso e nebuloso muitas vezes. Aprender pelo amor e não pela dor, pois a capacidade de fazer feliz é incontavelmente maior que a facilidade de errar. Segurar o ímpeto destrutivo e grosseiro que se esvai com a mobilidade dos ventos em tempestade. Exercitar um ato chamado perdão, mas na sua forma mais pura; que é ser capaz de ensinar antes que seu próximo erre e esteja sempre apto a aceitar que um melhor e maior que nós pode estar esperando na soleira de nossa porta esperando a resposta de um simples bom dia.

_É você aquele homem que esteve aqui muitos dias deste ano?

_Não, sou aquele que esteve aqui todo santo dia do ano que se passou. Que podia ter perdido a esperança de uma resposta. Que por vezes esteve aqui para dar um boa noite. Que não queria nada além de ser percebido, notado, tratado como igual. E nunca estive aqui travestido nas formas que nos causam comoção. Sempre trajei a roupa da igualdade e nem assim fui correspondido. Cometi a sutileza de usar as mesmas cores do seu sapato, o feitio de sua blusa e, ainda assim, quase idêntico, lhe fui indiferente.

_E por que então não desistiu? Para que tanta insistência com alguém que sequer nota sinais tão gritantes? O que tenho eu de tão especial para compartilhar seu tempo comigo?

_É o meu futuro rapaz. Veja como uma simples palavra demonstra que já aprendeu. Exatamente isso, compartilhar o tempo. E enquanto estiveres nesta terra de dor e injustiça, compartilhe seu amor, seu calor, sua vida. Dê como se fosse impossível fazer outra coisa, troque com o mundo que lhe cerca como se fosse a ultima atitude de sua breve existência, respire o ânimo da natureza que pode ser rude e transforme tudo a sua volta com seu esforço. Pois de nada adiantaria berrar às aves sabendo que elas, mesmo cantando aos seus ouvidos, nada lhe diriam. Vim porque para eu perpetuar precisava compartilhar com você e, como você mesmo percebeu, não perdi um segundo sequer.

_E deixou de fazer tudo que precisava para cumprir com sua missão? Não trabalha, não tem família? Não leva as crianças para escola?

_Faço tudo isso. As crianças, a propósito, estão no carro esperando para ir à escola. Minha esposa já saiu para trabalhar e o dia será pesado, com muito trabalho e responsabilidades e feliz, justo por isso.

_Você saiu de longe, me vigiou durante um ano todo? Não estou entendendo tudo isso!

_Sou seu vizinho, moro aqui faz um ano e resolvi lhe dar um bom dia. Depois da minha família, que vive comigo, você é a pessoa mais próxima. Sei até qual é a pizza que mais gosta. Queria somente poder passar a idéia que é possível ser notado, fazer parte e conviver, sem ser um fardo, um adversário ou um mero desconhecido. E isso tudo começou com um singelo bom dia.

_O que me fez responder hoje?

_Foi a pergunta que lhe fiz. Se estava tudo em ordem. É estranho como temos medo de parecer imperfeitos e frágeis. Quando apenas toquei sua suposta perfeição com uma pergunta normal, foi o bastante para que reagisse e retrucasse em tom de defesa. Neste momento, sem que fosse manifestada qualquer intenção da minha parte, você postou-se defensivamente e cedeu muito do tempo que supôs não ter. Por falar nisso, não está atrasado pra seu trabalho.

¬Sim, mas hoje nada supera o que ganhei em tão pouco tempo.

¬Verdade, dez minutos ou menos, que você acreditava que não tinha. Um abraço forte, e boa e muita sorte. E lembre-se que ela é diretamente proporcional ao desuso que fazemos dela. Assim como o destino e o acaso são meras desculpas para nossa falta de coragem, escusas toscas para nossa completa inaptidão para o sucesso. Sejamos fortes, grandes, bons e poderosos. Magnânimos na arte de conseguir e nem por isso deixar de querer e valorizar o que se tem. Que saibamos sempre medir o peso de nossos cestos em relação as sementes que plantamos com suor e afinco e não ao pomar alheio. E que sejamos humildes ao perguntar ao próximo, como fazer para colher tantos e tão belos frutos, mesmo sem dizer uma só palavra. Parto agora, a família espera e o dia é grande. Felicidades

_Idem! Obrigado! E antes que eu me esqueça, qual o seu nome?

_Não rotule as pessoas pelo que elas dizem de si próprias. Reconheça-as e as chame por aquilo que sente delas. Adeus!

_Mas para onde vai?

_Eu não, você! Seja pleno 2006!



Um feliz Ano Novo a todas as pessoas que fazem parte da minha vida. Um 2006 repleto e pleno de realizações e um bom dia, todo dia. Para que sejamos, todos nós, sempre, melhores. Que o amor invada a humanidade e que sejamos arrebatados pela vontade que move a História. Façamos nossa história e saibamos receber ajuda sempre que ela for precisa e necessária. E que saibamos doá-la, pois sabê-la egoisticamente é sim o maior desperdício.

Beijo em todos. Vamos que vamos!!

Sandro Costa, o Ambidestro