Há horas em que a vontade é arrebentar tudo
Destruir todas as fragilidades próprias
Fazer sucumbirem as defesas mais imponentes
Subjugar a prepotência alheia esmagadoramente
Esmigalhar qualquer atitude de resistência
A facilidade de agir inconsequentemente é deliciosa
Devastar, humilhar, espezinhar é fácil e natural
Tornar a paz um bem inalcançável, distante; errante
Exercício de ignorância plena, intensa, bestial
Tempo onde nem o mais celestial dos anjos reza
Por não ter sossego
Preocupado com a manutenção de sua vida
Retira as asas que agora pesam
Levanta os joelhos da calmaria segura e firme do solo
Exercitando o equilíbrio sobre pés frágeis, finos: franzinos
Como é densa a carne que levamos
O prazer proporcionado equivale à dor que ela suporta
Cada golpe, cada bofetada, cada espinho
O sorriso, o carinho, nosso vinho
Sentimos na vida o que passamos
Exacerba a concretude imediata e física
Infernalmente, nascemos sabendo
Invertidamente, uma analogia errada
Pois nem sempre o que dói é ruim ou mau
Afastamo-nos do instinto primário e salvador
Deixamos de ser animais e nos animalizamos
Absorvemos a sutileza da vida em comum
Tornando-nos sarcásticos, cáusticos, ácidos
Enchemo-nos de preconceitos
Convertendo-nos em enormes vazios
Cheios de nada até as grimpas
Envaidecidos por sermos apenas diferentes
Quando deveríamos ter nojo do que nos tornamos
Meros repetidores, receptores
Temos a obrigação de ser condutores
Convertendo a inimizade em entendimento
Levando a diante desejo de vida
Contrariando ensejos de alheia morte
Espalhar pensamentos de puro querer
Mas isso é diferente, incomum: perigoso
Imperceptível este desapegado
O quase santo que ama e peca
Com nome comum e simples
Perambulando entre os normais mortais
Sejamos nós, este pilar exemplificante
Traga para o seio de suas responsabilidades
Ser autor de lindos atos
Tão importantes quanto vulgares
Intente sua repetição aleatória e constante
Ensine como reproduzi-lo em série
Continue querendo destruir tudo de podre
Nefasto, vil, obtuso, abjeto
Mesquinho, pequeno, incorreto
Prime pela perfeição da eterna tentativa
Podemos ser melhores a cada instante
Irá sangrar e doer certamente
Perderemos carne e ganharemos alma
Trocaremos a ansiedade pela inexorável calma
Porém, sentiremos menos pavor
Deflagraremos um antes perdido mistério
Destilando amor do ódio
No aprendizado pelo bem frente à dor
Pois existe o retalho do frio
Mesmo sob intenso calor
Levemos a felicidade mais a sério
Pois somos muito a fazer
Por nos próprios, por quem merecer
Pelas mãos estendidas pelo caminho
Através de punhos cerrados a combater
Pelo prazer da arte que é conviver
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