15.7.05

Exposto

Espero alguém que finalmente chegue
Atravesso horas que gostaria que terminassem
Queria dias que em noite acabassem
Sem se arrastar pela madrugada replicante

Que nasce, floresce e renasce a cada dia

Gostaria de poder ligar para certo telefone
Escutar um alo despreocupado e sossegado
Com tempo livre e liberado
Sem espios ou olhares preocupados

Poder dizer: estou indo te buscar

Passear pela calçada de uma orla qualquer
De mãos dadas, dedos entrelaçados e calmos
Corpos que se mostram a quem quiser ver
Sem o tremular nervoso de quem não deve ser visto

Escancarar o que se sente livremente

Poder tomar um banho demorado
Para matar o tempo gostoso da espera
Manter-me sempre lindo e limpo
Por dentro, internamente; eternamente

Pois não sei quando irá chegar

Escolher aquela roupa que me deu
O perfume que seu olfato adora
Temperar a pele com o suor que sua língua aprecia
Esquentar o corpo para deixar a pele macia

Acariciar-te nua com o peso de meu corpo

Que não cansa de querer seu desejo
Cego à sua beleza
Justo por isso incansável
Em percorrer seus detalhes com meus dedos

Na proeza de saber cada seu detalhe

Configurando sua visão celestial e plena
Invasora sutil e permitida de minha esperança
Contraditória coma a derrota da vitória
Triste como a alegria fútil da volátil glória

De sermos juntos e sem constancia

Aspiro por sua permanência
Que não implica ser ininterrupta
Mas que carece em ser perene
Resistente ao mero até amanhã

Impávida aos domingos de lua que me atormentam a alma

Levando meu sossego num simples sopro
No brandir das folhas ao sabor do vento
Caindo ao menor esforço
Como se meus esforços fossem brotos

Tortos, rotos; incapazes perante seu outono

Que acinzenta minhas primaveras inférteis
Carente das águas neste verão seco
Desembocando num rio de inverno congelado
Atrofiado pelo gelo pirotécnico de meus alardes

Mudos, surdos, cegos, mas não covardes

Ainda ando por passos firmes
Joelhos justos e pernas fortes
Toco ao chão com aqueles por muitas vezes
A cabeça mira nuvens, condensando sorte

Esperando a bonança graciosa que me pertence

Corpo molhado, tempo ilhado
A terra faz-se lama e procura meus poros
Entra por fendas e feridas de pés descalços
Encontrando o calor na carne exposta das minhas frieiras

Portais sinalizadores do tempo de estrada

Tenho resistência para muito mais
Na mochila chamada paciência
Há uma carga indispensável
Aquilo que separa teimosia da perseverança

Toneladas essenciais de entendimento

Estive um dia do outro lado
Fui açoitado como escravo vadio
Minhas costas, largas e fortes
Devoradas pela sanha de um senhor impiedoso

O medo neutraliza a capacidade de sonhar

Escurece o brilho das pequenas e importantes coisas
Leva as asas que nos fazem voltar ao chão
E como balões vagamos sem destino, sem tino; desatino
Entregamos a vida ao reles contento do destino

Variável e desagradável em sua inutilidade

Fiz valer meu livre arbítrio
Decidi que suportaria errar
Compreendi que gostaria e seria humilde ao acertar
Polindo o orgulho com a delicadeza dos restauradores

Trazendo cor e forma a arte de ser meu próprio dono

Ser obra de minha matéria
Insumo de meu básico
História de minha lembrança
Saudade do sentir amor

Ser palavra de sua rima

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